sexta-feira, 3 de maio de 2013

COLUNA DO CARLITO LIMA


Querida Inês


Eu regressava do Recife contemplando a beleza do canavial ondulado, me recriminando não ter lhe visitado no Hospital quando recebi uma mensagem no celular. Ao ler, senti um choque, “Hoje o céu tá mais bonito. A Maria Inês foi pro céu. Betânia.” Incorrigível sentimental, chorei como um menino, Vânia me consolou acariciando meus cabelos. Respirei fundo, me refiz.  Restante da viagem rememorei os bons momentos que passamos e andamos juntos, minha querida guerreira, brava amiga.
 Nos anos 80, O José Roberto Fonseca chefe da Coordenação do Meio Ambiente, onde eu trabalhava, deu-me a tarefa de organizar um projeto de Educação Ambiental.  Convocamos os melhores técnicos do Brasil num seminário, uma semana de palestras e debates. Quem mais brilhou foi o velho Toinho, pescador de Penedo, seu pai. A partir desse seminário tornamos amigos, companheiros. Por conta disso viajamos para Curitiba e outros locais, arrasamos, fazíamos palestra juntos, iniciamos a consciência ecológica nas Alagoas.
Certa tarde de sábado, 1989, véspera do comício do Lula em Maceió, você e Ênio Lins entraram em minha casa com um probleminha.
 -“Lito, (assim você me chamava), amanhã é o comício do Lula fui encarregada de armar o palanque na praia de Pajuçara, os fiscais me proibiram, só com autorização escrita do Secretário de Desenvolvimento Urbano, ainda bem que é você, não fomos incomodar ao Prefeito Guilherme Palmeira, viemos direto, sei que a Prefeitura está fechada, resolva isso pelo amor de Deus, ou o comício será cancelado e temos convidados de todo o Brasil.”
Felizmente na minha pasta havia algumas folhas com papel timbrado da Prefeitura de Maceió. Coloquei papel na minha Olivetti e você mesma datilografou a autorização. Assinei, foi resolvido o problema. No domingo pela manhã você me levou um crachá, convidado especial para o palanque. Fiquei um pouco com a equipe de Guilherme na casa do Daniel Berard assistindo ao comício, certa hora fui aos bastidores do palanque. O uisquinho estava bem organizado, tira-gosto, e coisa e tal em uma farta mesa, passei o resto da tarde-noite em divertida roda, altos papos com os convidados especiais, meu amigo Djavan, Chico Buarque, Roberto Freire, Hugo Carvana, Majella, você, Ênio, Bomfim, um time de primeira qualidade. Lula perdeu a eleição, entretanto, a tarde etílica foi memorável.
No cemitério os amigos recordavam, lembravam sua alegria de viver, sua convicção política, sua capacidade de trabalho. Majella escreveu no Facebook.
A imagem que guardo da Inês é de uma militante comunista e feminista alagoana de Penedo. Em Maceió, participou das lutas estudantis, feministas e sociais tanto no período em se organizavam campanhas pela anistia para os presos, perseguidos e exilados, depois pela redemocratização, por eleições diretas para prefeitos das capitais e área de segurança nacional, governadores e presidente da república. Inês estava presente. Essa é a imagem que fica para mim. Além das boas, alegres e quase intermináveis conversas. Que a terra lhe seja leve, Inês.”

Eu adaptei um poema de Manoel Bandeira para você, minha Nêga.

 

Inês no Céu (Manoel Bandeira)”

“Inês preta... Inês boa... Inês sempre de bom humor.
Imagino Inês entrando no céu:- Licença, meu amigo!
E São Pedro bonachão: - Entra, Inês. Você não precisa pedir licença.”

Vou ficando por aqui, a página é curta que nem a vida. Qualquer dia a gente se encontra, vai custar um pouco, certamente farei um estágio obrigatório no Purgatório, purgando meus pecados. Até mais ver, querida Inês.

Do seu, Carlito Lima.


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