Querida
Inês
Eu
regressava do Recife contemplando a beleza do canavial ondulado, me
recriminando não ter lhe visitado no Hospital quando recebi uma mensagem no
celular. Ao ler, senti um choque, “Hoje o céu tá mais bonito. A Maria Inês foi
pro céu. Betânia.” Incorrigível sentimental, chorei como um menino, Vânia me
consolou acariciando meus cabelos. Respirei fundo, me refiz. Restante da viagem rememorei os bons momentos
que passamos e andamos juntos, minha querida guerreira, brava amiga.
Nos anos 80, O José Roberto Fonseca chefe da
Coordenação do Meio Ambiente, onde eu trabalhava, deu-me a tarefa de organizar
um projeto de Educação Ambiental. Convocamos
os melhores técnicos do Brasil num seminário, uma semana de palestras e
debates. Quem mais brilhou foi o velho Toinho, pescador de Penedo, seu pai. A
partir desse seminário tornamos amigos, companheiros. Por conta disso viajamos
para Curitiba e outros locais, arrasamos, fazíamos palestra juntos, iniciamos a
consciência ecológica nas Alagoas.
Certa
tarde de sábado, 1989, véspera do comício do Lula em Maceió, você e Ênio Lins entraram
em minha casa com um probleminha.
-“Lito, (assim você me chamava), amanhã é o
comício do Lula fui encarregada de armar o palanque na praia de Pajuçara, os
fiscais me proibiram, só com autorização escrita do Secretário de
Desenvolvimento Urbano, ainda bem que é você, não fomos incomodar ao Prefeito
Guilherme Palmeira, viemos direto, sei que a Prefeitura está fechada, resolva
isso pelo amor de Deus, ou o comício será cancelado e temos convidados de todo
o Brasil.”
Felizmente
na minha pasta havia algumas folhas com papel timbrado da Prefeitura de Maceió.
Coloquei papel na minha Olivetti e você mesma datilografou a autorização.
Assinei, foi resolvido o problema. No domingo pela manhã você me levou um
crachá, convidado especial para o palanque. Fiquei um pouco com a equipe de
Guilherme na casa do Daniel Berard assistindo ao comício, certa hora fui aos
bastidores do palanque. O uisquinho estava bem organizado, tira-gosto, e coisa
e tal em uma farta mesa, passei o resto da tarde-noite em divertida roda, altos
papos com os convidados especiais, meu amigo Djavan, Chico Buarque, Roberto Freire,
Hugo Carvana, Majella, você, Ênio, Bomfim, um time de primeira qualidade. Lula perdeu
a eleição, entretanto, a tarde etílica foi memorável.
No
cemitério os amigos recordavam, lembravam sua alegria de viver, sua convicção
política, sua capacidade de trabalho. Majella escreveu no Facebook.
“A imagem que guardo da Inês é de uma militante
comunista e feminista alagoana de Penedo. Em Maceió, participou das lutas
estudantis, feministas e sociais tanto no período em se organizavam campanhas
pela anistia para os presos, perseguidos e exilados, depois pela
redemocratização, por eleições diretas para prefeitos das capitais e área de
segurança nacional, governadores e presidente da república. Inês estava
presente. Essa é a imagem que fica para mim. Além
das boas, alegres e quase intermináveis conversas. Que a terra lhe seja leve,
Inês.”
Eu adaptei
um poema de Manoel Bandeira para você, minha Nêga.
“Inês no Céu (Manoel
Bandeira)”
“Inês preta... Inês boa... Inês sempre de bom humor.
Imagino Inês entrando no céu:- Licença, meu amigo!
E São Pedro bonachão: - Entra, Inês. Você não precisa pedir licença.”
Imagino Inês entrando no céu:- Licença, meu amigo!
E São Pedro bonachão: - Entra, Inês. Você não precisa pedir licença.”
Vou ficando por aqui, a página é curta que nem a vida. Qualquer dia a
gente se encontra, vai custar um pouco, certamente farei um estágio obrigatório
no Purgatório, purgando meus pecados. Até mais ver, querida Inês.
Do seu, Carlito Lima.
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