O
Enterro do Colaço
Livro Biográfico-
Geraldo Majella- Edições Bagaço
No final dos anos 70 conheci uma das figuras
marcantes na política alagoana, Rubens Colaço, líder dos estivadores, dirigente
do Partido Comunista Brasileiro.
Na época chegou a Maceió, Paulo
Cavalcante, deputado pernambucano, ex-preso político no quartel onde eu servia
como tenente em 1964, a 2ª Companhia de Guardas no Recife. Paulo pediu aos companheiros de partido para
ter algum contato com seu ex-“carcereiro”, o tenente Lima. Rubens Colaço logo
me telefonou. Passamos um fim de semana mostrando as belezas de Maceió a Paulo,
junto com Geraldo Majella e Alberto Jambo. Pajuçara, Ponta Verde, Jatiúca,
Praia do Francês, passeio na Lagoa com direito a banho no Broma, Marechal
Deodoro, bons papos, boas cervejas, peixe e camarão, comunista também gosta de
coisa boa. Paulo Cavalcante recordou muitas histórias durante sua prisão na
Companhia de Guardas. Escreveu um livro, “O Caso Conto Como O Caso Foi”, ao ler
fiquei emocionado com opiniões a respeito do ex-“carcereiro” que virou amigo.
Assim consolidei minha amizade com Colaço.
Nos bares da cidade encontrava-me com o velho guerreiro; sempre um bom papo,
excelente humor e copo. Certa vez um lavador de carro encontrou no meu fusca
uma dentadura, eu havia tomado umas cervejas com Rubens no dia anterior, fui
até sua casa. Encontrei-o banguela. Vibrou quando avistou sua amada dentadura.
Voltou a ter aquele sorriso maroto.
Anos depois Colaço morreu, houve uma
comoção entre os moradores de Jaraguá, do Poço, Ponta da Terra e adjacências.
Os estivadores do caís do porto pararam de trabalhar para homenagear o grande
líder. Os pobres, os descamisados, os sem terra, sem teto, perdiam seu pai, seu
irmão, seu farol, seu guru.
O enterro saiu de sua casa repleta de
estivadores, catraieiros, gente do povo, choravam a morte de um homem que se
dedicou às causas populares. Em pouco tempo a cachaça e a cerveja rolaram. O
choro e a emoção aumentavam com a branquinha. Intelectuais, políticos,
desocupados, até um padre e uma cafetina se apinhavam na casa. Seus amigos de
copo e de luta prestavam a última e dolorosa homenagem.
Passava da hora de sair o enterro.
Ninguém disposto a fechar o caixão. Até que Seu Gilberto (pai de Edberto
Ticianeli) advertiu, tinha chegado o momento; a família acatou.
Ao segurar na tampa do caixão, um
dos chorosos amigos, cheio de cachaça na cabeça, pediu para adiar o enterro,
ficar mais um pouco com Colaço.
Formou-se uma calorosa discussão.
Fizeram reunião na sala ao lado. Depois de muito discutir, Seu Gilberto irritado
com os companheiros bêbados, insistentes, saiu da sala, desabafou num rompante:
-
“Tudo bem façam o que quiserem. Peguem o defunto com caixão e tudo e
enfiem no cu”.
Deu-se um mal estar. A família do morto
resolveu levá-lo naquela hora. Tamparam o caixão, foram em direção à sua última
morada no cemitério de Jaraguá. O féretro seguiu a pé, alguém orientava o
percurso.
Ao chegar ao cemitério, mandaram entrar à
direita. Nesse momento, um fiel amigo, cheio da cachaça, gritou:
-
“Parem o enterro! O companheiro Rubens nunca entrou à direita quando vivo,
sempre foi coerente com seus princípios e não será agora depois de morto que
ele vá entrar à direita. Rubens Colaço só entra à esquerda!”
Nessa altura os acompanhantes, alguns
com a branquinha na mão, começaram a aplaudir. Os companheiros inflamados
gritavam: “Muito bem! Viva Rubens Colaço!
Ninguém entra à direita!”
Não houve argumento. Fizeram um enorme e
complicado itinerário dando arrodeios nas quadras de tumbas e mausoléus.
Assim, com ajuda dos companheiros, o
grande Colaço continuou coerente, digno dentro de um caixão, entrando sempre às
esquerdas, chegou finalmente em sua morada no cemitério de Jaraguá.
Hoje deve estar sentado à esquerda de
Deus pai, todo poderoso.
LEIAM O LIVRO DE GERALDO MAJELLA: “RUBENS COLAÇO, PAIXÃO E VIDA”.
EDIÇÕES BAGAÇO - RECIFE
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