Anjos Nordestinos
Desde menino Celso foi
econômico, sovina, mão de vaca, aos 60 anos possui invejável patrimônio. Final
do ano Celso sentiu-se mal, suava frio, foi levado à emergência do coração da
Santa Casa. Sorte ter encontrado os competentes Dr. Wanderley e Dra. Mônica. Os
médicos diagnosticaram enfarto, providenciaram operação de urgência.
As mãos
do Dr. Wanderley fizeram milagre mais uma vez. O caso de Celso foi grave, ficou
em coma pós-operatório duas semanas. Durante o coma sonhava repetidamente, dois
enormes pássaros brancos revoando em círculo por sua cabeça. Em certo momento
os pássaros se transformavam em mulheres aladas, véus soltos envolviam os corpos
sensuais, seminus. Encostavam-se ao doente provocando agradável excitação.
Mês
passado Celso desobedeceu à orientação médica, dirigindo sozinho seu Honda Fit
foi vistoriar sua fazenda em Penedo. Ao passar sobre a ponte da Lagoa Mundaú
percebeu duas jovens, uma morena, outra alourada, típicas nordestinas, vestiam shorts
curtos de jeans, mochilas nos ombros, pediam carona com o dedo.
Celso freou
o carro, as moças perguntaram para onde ia o nosso herói.
- “Para Penedo, e vocês? Por acaso são
assaltantes?”
As duas
belas fêmeas aproximaram rápido no carro, sorriram para Celso.
- “Vamos também para Penedo. E o senhor, por
acaso é estuprador?”
Meia hora depois, na estrada, um caminhão desgovernado em sentido contrário
passou para o lado oposto na pista, atravessou o acostamento caiu em uma
pequena barreira. Celso conseguiu frear o carro, respirou fundo, por questão se
segundos o caminhão não bateu de frente no seu Honda. Prosseguiu viagem, de
repente encarou as jovens, compreendeu, se não tivesse parado naquele momento
para dar carona às moças, ele teria sido esmagado pelo caminhão. Deu-lhe um
frio na barriga.
As caroneiras eram divertidas, conversavam e
riam bastante. Continuaram pela esplendida estrada até chegar à praia do Miai.
Celso saiu do asfalto entrou na extensa praia fazendo a areia dura de rodagem
até a foz do Rio São Francisco.
A estrada
improvisada mais bonita do mundo, de num lado um exuberante verde coqueiral, do
outro o mar azul-esverdeado. O céu limpo, azul, luminosa manhã.
Durante o percurso pararam para fotografar a carcaça de um velho navio
afundado à beira-mar. Pediram a um jangadeiro para fotografá-los imitando os
personagens do filme Titanic. Celso em pé, na proa, entre as duas jovens como
recheio de um sanduíche, os três de braços abertos encostavam-se. Ele ficou
excitado, veio-lhe a imagem do seu sonho no coma, os pássaros brancos, as
mulheres aladas.
Visitaram
a fazenda, a bela Penedo, ao cair da tarde hospedaram-se no Hotel S. Francisco.
Noite de brisa fresca, jantaram na Rocheira, peixe, camarão e jacaré, regados a
uísque, cerveja e uma boa cachacinha. Conversaram, cantaram, apreciando o
magnífico Rio São Francisco refletindo as luzes da velha cidade.
Era tarde
da noite quando retornaram ao hotel cantando pelas ruas estreitas, enladeiradas.
Deitaram-se, fizeram amor, amor a três, “ménage a trois”. Nos intensos momentos
de prazer vinham-lhe as imagens do sonho, duas mulheres aladas e nuas juntas a
seu corpo. Celso sentiu a morte e a vida. Dormiu feliz entre as amigas, sonhou
com os pássaros alados.
Ao acordar, as meninas desapareceram. Na
portaria deixaram um bilhete, “Querido
Celso cuide-se, ame muito, ame a vida, a vida é bela, é o maior bem do ser
humano. Beijos Walkíria e Gabriela”.
Celso um
descrente religioso, hoje tem convicção, aquelas moças eram anjos, anjos da
guarda, walquírias nômades protetoras, salvaram-no da morte. A inesquecível
noite de intenso amor deu-lhe um novo sentido à vida. Quem disse, anjo não tem
sexo?
Celso
transformou-se, é outro homem, mudou sua escala de valores, olha o mundo com outro
significado. Canta a vida, é bonita, é bonita e é bonita. Deixou de ser
canguinha, ajuda aos menos favorecidos. Tornou-se homem generoso, alegre, feliz.
Recentemente recebeu, via correio, um misterioso envelope sem remetente,
carimbado de Campina Grande. Continha apenas uma fotografia da carcaça do navio
na praia do Miaí, Celso de braços abertos, sozinho, sem as jovens, sem os
anjos, elas não aparecem na foto. Deu-lhe um arrepio, se emocionou, chorou.
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