quinta-feira, 6 de junho de 2013

UM TEXTO DE SEBASTIÃO NERY

O MARECHAL DA CULTURA

                                                                           
Sebastião Nery
         
  ( Esta crônica do jornalista Sebastião Nery foi publicada em mais de 30 jornais em todo Brasil, reproduzida em mais de 100 sites-blogs)

Marechal Deodoro (AL) – Lá em cima, na mitológica Normandia, cabeça e norte da França, estuário do Rio Sena, de frente para a Inglaterra a quem pertenceu em tempos passados, separadas pelo Canal da Mancha, sob o qual passa hoje o túnel onde mergulha o trem que liga os dois países, há uma pequena cidade encantada com nome de flor: Honfleur.

O Vale do Sena é bordejado de verde e de vaquinhas normandas. Famosos o creme de leite e o Camembert da Normandia. E o conhaque Calvados e a cidra, produzidos com as maçãs que enfeitam os prados.

Honfleur, no século 15, era um porto defensivo contra invasões inglesas, em formato retangular e cercado por três ruas de edificações seculares. É como se fosse uma praça, só que no meio é água e o quarto lado dá para o Rio Sena, que desemboca no Atlântico, um pouco mais adiante. As casas dão a impressão de ter 500 anos ou mais, até hoje habitadas. A primeira referência histórica a Honfleur é de 1027.



HONFLEUR

E o que Alagoas tem com isso? Tem tudo. Em 1500, Portugal chegou a Porto Seguro, viu, gostou, admirou, elogiou, plantou o Marco do Descobrimento, ergueu uma cruz, celebrou uma missa e foi embora. Os piratas fizeram a festa. Sobretudo os franceses. Durou séculos o saque, o contrabando e a farra do pau-brasil. Em Alagoas, os caminhos estavam prontos: havia o mar com a “Praia do Porto do Francês”, o Rio São Francisco, os rios Mundaú e Paraíba, as lagoas. Eles chegavam, pegavam o Pau Brasil e levavam, sobretudo para os portos do Havre e de Honfleur, um em frente ao outro. Era o Brasil construindo a Europa, as casas da Europa. Em 1611, nasceu a primeira capital de Alagoas (hoje Marechal Deodoro) como Povoado de Vila Madalena de Sumaúna, para proteger o pau-brasil do contrabando e da ação de piratas e outros. Em 1636 já era o Município de Santa Maria Madalena da Lagoa do Sul. Só em 1817, capital da capitania de Alagoas, com o nome de Alagoas. Em 1823, cidade. Em 1839, a capital foi para Maceió. E em 1939, o nome da velha cidade foi mudado para Marechal Deodoro, em homenagem ao filho ex-presidente.

A III FLIMAR

Há três anos, o talento, a competência e a dedicação do jornalista, escritor e coronel (do Exército) Carlito Lima, secretário de Cultura da cidade, criaram a Flimar (Festa Literária de Marechal Deodoro). No último fim de semana, realizou-se a 3ª. Veio gente do País inteiro, do Rio Grande do Sul ao Amapá, e da América Latina: jornalistas, escritores, conferencistas, poetas, cantores, grupos de teatro, folclore. Durante cinco dias, diante de suas magníficas igrejas barrocas e sobrados patinados, e sobre as praças de pedras seculares, a cidade tornou-se um anfiteatro da cultura a céu aberto.

Este ano, a III Flimar homenageou três consagrados intelectuais: o antropólogo e folclorista alagoano Théo Brandão (Theotônio Vilela Brandão), que fez parte da celebrada geração de Graciliano Ramos, Raul Lima, José Lins do Rego, Rachel de Queiroz e seu marido José Auto, Aurélio Buarque, Diegues Junior, tantos outros; homenageou também o alagoano acadêmico Lêdo Ivo, maior poeta vivo do País, e o consagrado romancista baiano-carioca Antonio Torres (Prêmio Machado de Assis da Academia Brasileira de Letras), com palestras sobre as obras de cada um.

“A NUVEM”

Todos os dias, de manhã, de tarde e à noite, intelectuais fizeram conferências. Ricardo Cravo Albin, com sua sabedoria e bagagem histórica, celebrou os 100 anos de Luiz Gonzaga, mostrando a contribuição do Rei do Baião para o País ficar conhecendo o verdadeiro rosto do Nordeste.

O romancista Antonio Torres, o jornalista e escritor Luiz Gutemberg e Janaína Amado debateram o significado lítero-cultural do centenário do saudoso Jorge Amado. A escritora e critica literária baiana Miriam Salles analisou a nova literatura nordestina, amazônica e do Centro Oeste. Durante três horas, a carioca Beatriz Rabello apresentou para dezenas de bibliófilos uma oficina de restauração de livros antigos.

E eu mostrei minha experiência, no Brasil e como correspondente de imprensa, de meio século de jornalista que também publica livros, como contei em meu último livro A Nuvem – O que ficou do que passou. 


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