quarta-feira, 19 de junho de 2013

HISTÓRIAS DO VELHO CAPITA - Um texto de Carlito Lima

                      Anjos Nordestinos




          Desde menino Celso foi econômico, sovina, mão de vaca, aos 60 anos possui invejável patrimônio. Final do ano Celso sentiu-se mal, suava frio, foi levado à emergência do coração da Santa Casa. Sorte ter encontrado os competentes Dr. Wanderley e Dra. Mônica. Os médicos diagnosticaram enfarto, providenciaram operação de urgência.
      As mãos do Dr. Wanderley fizeram milagre mais uma vez. O caso de Celso foi grave, ficou em coma pós-operatório duas semanas. Durante o coma sonhava repetidamente, dois enormes pássaros brancos revoando em círculo por sua cabeça. Em certo momento os pássaros se transformavam em mulheres aladas, véus soltos envolviam os corpos sensuais, seminus. Encostavam-se ao doente provocando agradável excitação.
     Mês passado Celso desobedeceu à orientação médica, dirigindo sozinho seu Honda Fit foi vistoriar sua fazenda em Penedo.  Ao passar sobre a ponte da Lagoa Mundaú percebeu duas jovens, uma morena, outra alourada, típicas nordestinas, vestiam shorts curtos de jeans, mochilas nos ombros, pediam carona com o dedo.
     Celso freou o carro, as moças perguntaram para onde ia o nosso herói.
- “Para Penedo, e vocês? Por acaso são assaltantes?”
  As duas belas fêmeas aproximaram rápido no carro, sorriram para Celso.
   - “Vamos também para Penedo. E o senhor, por acaso é estuprador?”
                 Meia hora depois, na estrada, um caminhão desgovernado em sentido contrário passou para o lado oposto na pista, atravessou o acostamento caiu em uma pequena barreira. Celso conseguiu frear o carro, respirou fundo, por questão se segundos o caminhão não bateu de frente no seu Honda. Prosseguiu viagem, de repente encarou as jovens, compreendeu, se não tivesse parado naquele momento para dar carona às moças, ele teria sido esmagado pelo caminhão. Deu-lhe um frio na barriga.
     As caroneiras eram divertidas, conversavam e riam bastante. Continuaram pela esplendida estrada até chegar à praia do Miai. Celso saiu do asfalto entrou na extensa praia fazendo a areia dura de rodagem até a foz do Rio São Francisco.
      A estrada improvisada mais bonita do mundo, de num lado um exuberante verde coqueiral, do outro o mar azul-esverdeado. O céu limpo, azul, luminosa manhã.
      Durante o percurso pararam para fotografar a carcaça de um velho navio afundado à beira-mar. Pediram a um jangadeiro para fotografá-los imitando os personagens do filme Titanic. Celso em pé, na proa, entre as duas jovens como recheio de um sanduíche, os três de braços abertos encostavam-se. Ele ficou excitado, veio-lhe a imagem do seu sonho no coma, os pássaros brancos, as mulheres aladas.
         Visitaram a fazenda, a bela Penedo, ao cair da tarde hospedaram-se no Hotel S. Francisco. Noite de brisa fresca, jantaram na Rocheira, peixe, camarão e jacaré, regados a uísque, cerveja e uma boa cachacinha. Conversaram, cantaram, apreciando o magnífico Rio São Francisco refletindo as luzes da velha cidade.
      Era tarde da noite quando retornaram ao hotel cantando pelas ruas estreitas, enladeiradas. Deitaram-se, fizeram amor, amor a três, “ménage a trois”. Nos intensos momentos de prazer vinham-lhe as imagens do sonho, duas mulheres aladas e nuas juntas a seu corpo. Celso sentiu a morte e a vida. Dormiu feliz entre as amigas, sonhou com os pássaros alados.
       Ao acordar, as meninas desapareceram. Na portaria deixaram um bilhete, “Querido Celso cuide-se, ame muito, ame a vida, a vida é bela, é o maior bem do ser humano. Beijos Walkíria e Gabriela”.
      Celso um descrente religioso, hoje tem convicção, aquelas moças eram anjos, anjos da guarda, walquírias nômades protetoras, salvaram-no da morte. A inesquecível noite de intenso amor deu-lhe um novo sentido à vida. Quem disse, anjo não tem sexo?
      Celso transformou-se, é outro homem, mudou sua escala de valores, olha o mundo com outro significado. Canta a vida, é bonita, é bonita e é bonita. Deixou de ser canguinha, ajuda aos menos favorecidos. Tornou-se homem generoso, alegre, feliz.
     Recentemente recebeu, via correio, um misterioso envelope sem remetente, carimbado de Campina Grande. Continha apenas uma fotografia da carcaça do navio na praia do Miaí, Celso de braços abertos, sozinho, sem as jovens, sem os anjos, elas não aparecem na foto. Deu-lhe um arrepio, se emocionou, chorou.



     

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